15.9.08

O Medo


Em verdade temos medo.
Nascemos escuro.
As existências são poucas:
Carteiro, ditador, soldado.
Nosso destino, incompleto.

E fomos educados para o medo.
Cheiramos flores de medo.
Vestimos panos de medo.
De medo, vermelhos rios
vadeamos.

Somos apenas uns homens
e a natureza traiu-nos.
Há as árvores, as fábricas,
Doenças galopantes, fomes.

Refugiamo-nos no amor,
este célebre sentimento,
e o amor faltou: chovia,
ventava, fazia frio em São Paulo.

Fazia frio em São Paulo...
Nevava.
O medo, com sua capa,
nos dissimula e nos berça.

Fiquei com medo de ti,
meu companheiro moreno,
De nós, de vós: e de tudo.
Estou com medo da honra.

Assim nos criam burgueses,
Nosso caminho: traçado.
Por que morrer em conjunto?
E se todos nós vivêssemos?

Vem, harmonia do medo,
vem, ó terror das estradas,
susto na noite, receio
de águas poluídas. Muletas
do homem só. Ajudai-nos,
lentos poderes do láudano.
Até a canção medrosa
se parte, se transe e cala-se.

Faremos casas de medo,
duros tijolos de medo,
medrosos caules, repuxos,
ruas só de medo e calma.

E com asas de prudência,
com resplendores covardes,
atingiremos o cimo
de nossa cauta subida.

O medo, com sua física,
tanto produz: carcereiros,
edifícios, escritores,
este poema; outras vidas.

Tenhamos o maior pavor,
Os mais velhos compreendem.
O medo cristalizou-os.
Estátuas sábias, adeus.

Adeus: vamos para a frente,
recuando de olhos acesos.
Nossos filhos tão felizes...
Fiéis herdeiros do medo,

eles povoam a cidade.
Depois da cidade, o mundo.
Depois do mundo, as estrelas,
dançando o baile do medo.

(Drummond, in A Rosa do Povo)

13.9.08

Migalhas dormidas do teu pão

"Freakshow" - The Cure


Pessoas próximas sabem que gosto muito da banda inglesa The Cure.
E não é aquele ‘gostar’ de apenas hits famosos como ‘Boys Dont Cry’, etc.
Na década de 80, com 09 anos de idade, ouvi pela primeira vez, na rádio Transamérica, o estouro de “In Between Days”.
Fiquei anestesiado.
De lá pra cá, acompanhei o sucesso e o sumiço (!?) da banda na mídia em 2000, após o lançamento de “Bloodflowers”.
As letras da banda sempre me fascinaram.
Tristeza, melancolia, amor, dor. Cure é poesia pura, basta ouvir e sentir “a Letter to Elise” que é uma das canções mais belas.
Mas, pensei que eu era fã, mas não sou.
Kid Vinil é um incorrigível fã do Cure.
O depoimento dele extraído de seu blog, acerca do lançamento, este ano, de 4 singles da banda, merece ser transcrito neste blog, vejam:

“Pra muitos criticar é fácil falando que Robert Smith não fez nada de novo ou não seguiu nenhuma onda electro sei lá o que pra ser moderninho. Tá certo ele, manteve o estilão de sempre do Cure e não errou. O que se pode ouvir nesses quatro singles é o autentico estilo The Cure que continua influenciando gerações. O terceiro desses singles a faixa "Sleep When I´m dead" é uma das coisas mais incríveis que Robert Smith fez nos últimos anos, pop perfeito com a marca registrada Cure, isso é o que vale.
Nunca me esquecerei aquele dia lá pelos idos de 1987 quando entreguei pra Robert Smith o premio de melhor banda da revista Bizz no Teatro Municipal do Rio Janeiro. Apertei aquela mãozinha flácida e milagrosa, era como se tivesse beijado a mão do Papa, foi um momento mágico na minha vida. (é sério mesmo!!!).Confesso que continuo fã do Cure e comprei todos esses compactos e estou aguardando ansiosamente pelo álbum dia 13 de Outubro.
Fiquem com o video de "Freakshow", detalhe: Fat Bob não mudou em nada, até o penteado continua o mesmo, lindo!!!"
Texto completo em http://www.kidvinil.blogspot.com/

Coisa de fã mesmo.
Fã é assim.... Exagerado assumido.
Desses exageros, lembro das famosas declarações de Rita Lee para David Bowie:

“Lamberei a maçaneta da porta onde tua mão tocar... Me farei de tapete por sobre a poça de chuva atômica para que tua passagem seja feliz e segura. David Robert Jones, que enorme prazer em ter prazer sendo tua fã, tua gueixa, tua escrava, tua sempre tão macaca de auditório!”

Esses roqueiros exagerados...

11.9.08

Ninguem Sai

Não consigo rir com nenhum desses programas de humor.
(Não. O problema não é comigo, é com a programação mesmo)
Então, navegando pela rede encontrei esse vídeo genial da TV Pirata, adaptação de “Pôquer interminável” de Luís Fernando Veríssimo do livro "O Analista de Bagé".
Aliás, Veríssimo era um dos roteiristas do programa, de alto nível, diga-se de passagem.
Fazia parte da equipe (por trás das câmeras é claro), Laerte e Glauco (quadrinhos), e a turma que foi embrião do Casseta e Planeta (Bussunda e Cia).
O elenco inesquecível: Guilherme Karan, Cláudia Raia, Débora Bloch, Marco Nanini, Maria Zilda Bethlem, Ney Latorraca, Cristina Pereira, Luiz Fernando Guimarães, Regina Casé, entre outros.
Esse humor não tem igual.

2.9.08

LEI SECA "NAZISTA"


Excelente o artigo publicado pelo Professor Luiz Flávio Gomes, Doutor em Direito Penal, sobre a famigerada “Lei Seca”.
Referência do artigo: (GOMES, Luiz Flávio. Lei seca: acertos, equívocos, abusos e impunidade. Disponível em http://www.lfg.com.br/. 04 julho. 2008)

Antes que surjam críticas por aqueles que alegam que “a lei reduziu os acidentes”, o que é indiscutível, o renomado professor esclarece que a lei só “pega” quando há efetiva fiscalização. Ou seja, é um problema do Poder Público.
O artigo do Professor até cita a Cidade de Macapá como exemplo de como a ausência de fiscalização não reduz os índices de acidentes.

Dentre as críticas (e não foram poucas), vejam os trechos interessantes:

Não pode haver crime de perigo abstrato:

“O art. 306 do CTB não pode ser interpretado (secamente) como delito de perigo abstrato. O perigo abstrato é válido somente no campo administrativo. É inadmissível no âmbito do Direito penal.”
“Contentar-se, no âmbito penal, com o simples perigo abstrato significa dar curso ao abominável Direito penal do inimigo, que pune o agente sem o devido respeito às garantias mínimas do Direito penal (estando, dentre elas, o princípio a ofensividade). O Direito penal nazista fez muito uso dessa técnica legislativa consistente na infração de perigo abstrato (ou seja: mera desobediência à norma, sem nenhuma preocupação com a ofensa ao bem jurídico). Não podemos repetir o que historicamente se tem como abominável. Não podemos conceber como válida uma interpretação nazista do Direito penal.”


Recusar a fazer o Bafômetro:


“A recusa ao exame de sangue e ao bafômetro não está sujeita a nenhuma sanção. Quando alguém exercita um direito (direito de não-autoincriminação) não pode sofrer qualquer tipo de sanção. O que está autorizado por uma norma não pode estar proibido por outra.”


Lei Seca gera impunidade


“... "lei seca" não beneficiou somente os que cometeram delito até o dia 19.06.08. Ela é, também, extremamente favorável aos que vão delinqüir daqui para frente. Vejamos: as duas únicas formas correntes de se comprovar no Brasil a taxa de dosagem alcoólica são: exame de sangue e bafômetro. A esses dois meios de prova o motorista suspeito não está obrigado a se submeter, porque ninguém é obrigado a ceder seu corpo para fazer prova contra si mesmo (princípio da não auto-incriminação).
É certo que existem outras formas de se comprovar a embriaguez: exame clínico, fotos, prova testemunhal. Mas nenhum desses meios consegue definir (com precisão) a quantidade de álcool no sangue. Logo, se o motorista recusa o exame de sangue e o bafômetro (o que é um direito seu, diga-se de passagem, não podendo ser punido nem sequer administrativamente por essa recusa), ficará praticamente impossível ao poder público comprovar o nível de dosagem alcoólica no motorista. Conclusão: sem a prova da materialidade do delito nem sequer prisão em flagrante pode haver. De outro lado, sem tal materialidade, não há como comprovar a existência do crime. Havendo prova de que o agente estava bêbado mas não se comprovando o nível de dosagem alcoólica, pune-se o sujeito pela infração administrativa, mas não há que se falar em delito.”